Ser modelo não é para qualquer um...

Chegam à escola de manequins ainda com borbulhas. Elas com 13 ou 14 anos. Eles um pouco mais. Nessa idade é quase impossível saber se o busto vai ser grande, se a anca vai ser larga. Mas os profissionais sabem. Têm os olhos treinados. Medem-nas bem medidas, tiram-lhe as feições, tentam perceber a personalidade daquelas crianças que estão a deixar de o ser. "Fazemos uma aposta", diz Paulo Araújo, coordenador da Escola de Formação de Manequins Ana Wilson, uma das mais conceituadas do país. "Temos que perceber aquilo que eles podem vir a ser."

Naquela escola, todos os fins-de-semana, durante cinco meses, os futuros modelos aprendem a andar na passerelle (com um livro em cima da cabeça, como se vê no filmes), os truques para uma boa fotografia, como tirar o casaco em andamento ou andar em saltos de 14 centímetros, estudam história da moda, tendências e até as coisas mais básicas como ler um contrato ou passar recibos verdes. No fim, apresentam-se às agências com meia dúzias de fotografias onde já são mulherzinhas de lábios vermelhos.

Mas não é preciso ter um curso para se ser modelo. Uma jovem pode estar calmamente no supermercado ou a tomar café numa esplanada e ser abordada por um booker que lhe estende o cartão. "Quem está nesta área está sempre a trabalhar", conta Elsa Gervásio que, depois de uma carreira como modelo, tem agora a sua própria agência, a Just Models. "Antes havia alguma desconfiança mas agora as pessoas estão informadas, há uma maior abertura. Os próprios pais estão muito disponíveis e incentivam os filhos a experimentarem."

Os pais são os principais aliados das agências de modelos, uma vez que estas estão a lidar com menores. Os pais têm de assinar contratos, dar autorizações e apoiar os filhos, mesmo quando eles faltam às aulas ou começam a deixar para trás os estudos. Nenhuma das agências com quem falámos admitiu contratar raparigas com menos de 14 anos e todas apontaram os 15 como a idade ideal para se começar. "Procuramos pessoas que estejam em idade de ser trabalhadas. Eu acredito que não existem manequins, trabalham para ser manequins", explica Luís Graça, booker da L'Agence, que está no mercado há 19 anos. "Com 14, 15, 16 anos é uma boa idade para começar, mas não a tempo inteiro. Nunca exigiríamos a uma pessoa tão jovem um trabalho tão sério como este pode ser e com estes níveis de responsabilidade." Os primeiros tempos são de aprendizagem e testes. "Às vezes vemos as manequins e aquilo que podem ser. Mas elas ainda têm de crescer para ver isso." O processo demora entre seis meses a um ano, até que possam de facto estar no mercado.

Mas não basta ter 14 anos e uma carinha laroca. Há outros requisitos. Elsa Gervásio não tem dúvidas: "Para se ser modelo tem de se ter as características físicas. As medidas são importantes. Depois, têm que ter boa pele, bom cabelo, bons dentes. E é importante que tenha personalidade, que tenha atitude, vontade de trabalhar."

As medidas. É impossível fugir a elas. Ana Borges, a mulher que há 14 anos lidera a Elite Models, confessa que já foi "muito mais rígida". "Agora, analiso primeiro a fotogenia e a telegenia e só depois olho para as medidas." Mas tem de olhar. E é nesse momento que tudo verdadeiramente se define: "Eu não mando ninguém emagrecer mas a verdade é que quem é gordo não pode ser modelo. Lamento mas é assim. Uma rapariga com mais de 90 centímentos de anca pode ser muito gira e fazer outras coisas mas não desfila na passerelle."

"É sempre complicado, nós lidamos com miúdas e miúdos muito novinhos, mas tem de ser", corrobora Elsa Gervásio. "Por muito que me custe tenho que dizer a uma miúda de 15 anos que até é gira, que lá no liceu faz imenso sucesso, mas que se calhar para a moda precisa ser um pouco mais alta ou um pouco mais magra. Quem não tem aquelas medidas pode fazer outras coisas mas não faz desfiles."

Podem, por exemplo, fazer publicidade, tornar-se actores ou apresentadores de televisão - e são cada vez mais as agências de modelos que têm departamentos ligados a estas áreas. Mas para desfilar mesmo, para ambicionar estar um dia em Milão, em Paris ou Nova Iorque, uma modelo tem que ter o corpo ideal, sobretudo se for mulher. Apesar desta pressão enorme, que todos admitem, a palavra anorexia é quase um tabu no mundo da moda. "A anorexia existe mas não se comenta muito, todos nós temos um certo receio de falar nisso", afirma Sofia Frazão, da agência Power Model.

A morte de alguns modelos, no ano passado, pôs a nu, definitivamente, uma questão que todos queriam evitar. Desde então, algumas passerelles estabeleceram medidas mínimas para as modelos. E, este mês, a semana da moda Londres não admitia jovens com menos de 16 anos. A ModaLisboa não tem requisitos mínimos, esclarece Paulo Gomes, responsável pelo castin do evento. Em Portugal, a anorexia existe mas é rara, dizem-nos. Haverá casos, talvez, entre os modelos que estão no mercado internacional. Mas o discurso politicamente correcto diz que uma modelo para ser bela tem que ser saudável. "Uma pessoa doente não tem bom aspecto", diz Luís Graça. "A magreza exagerada, como a gordura exagerada, não tem nada a ver com beleza", afirma Ana Borges.

"O risco de anorexia não existe só entre os modelos. E o trabalho só por si não é mau, se for um part time pode ser divertido", comenta a pedopsiquiatra Graça Milheiro. "Mas é preciso ter em conta a estrutura de cada jovem, o contexto familiar e a pressão social. Se a imagem corporal for muito valorizada e a pressão for muito grande pode haver problemas."

E os problemas não têm só a ver com dietas. Podem ser esgotamentos. As raparigas que passam horas nos ginásios, que andam sempre impecáveis, depilação total, unhas perfeitas, cabelos lindos, pele cuidada e que, mesmo assim, se desdobram em castings e são constantemente rejeitadas sofrem uma pressão que não tem nada a ver com a vida simples de uma liceal. Entre as mulheres, a competição pode mesmo tomar contornos de malvadez. É preciso estar preparada para sobreviver às partidas das colegas - que podem roubar os sapatos ou o telefone, só para impedir outra de chegar a tempo e horas a um casting.

Desenganem-se os que pensam que é só chegar lá e sorrir. Perguntem a quem quiser. Dá muito trabalho. É stressante. E nem todos aguentam. "É bom que um modelo tenha sonhos e seja ambiciosa, mas também é preciso gerir as expectativas e ter os pés na terra", assegura Miguel Blanc, director de L'Agence. "O sucesso depende mais da personalidade do que da beleza. A beleza é a condição básica mas a personalidade faz a diferença."


Fonte: DN

Comentários

Mirna disse…
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